Surpreendente e visionário
Nesta pequena grande obra, C. S. Lewis nos mostra o quanto merece ser reconhecido como um dos maiores intelectuais do século XX. Brilhante, ele faz uma profunda reflexão sobre os valores morais e universais que são a base de toda a civilização humana, em contraponto com o relativismo moderno que passou a permear nossa cultura e nossa educação.
Fazendo referências a grandes pensadores da nossa história, como Aristóteles, Platão, Santo Agostinho, Confúcio, entre outros, ele mostra o quanto a base filosófica, intelectual e religiosa de todos os povos partem dos mesmos princípios que moldam seus valores e virtudes. Para isso, utiliza-se do conceito milenar chinês do Tao, que trata da realidade que vai além de todas as situações, do abismo que havia antes do próprio Criador, do Caminho pelo qual o universo caminha e do qual emergem as coisas de forma eterna, silenciosa e tranquila para o espaço e o tempo. Trata-se também da Via que todo homem deve trilhar, imitando o progresso cósmico e em harmonia com a Natureza. O Tao seria então a única fonte de todos os juízos de valor. Se ele for rejeitado, todos os valores também serão rejeitados.
Utilizando-se dessa concepção do Tao em todas as suas formas, sejam elas platônicas, aristotélicas, estoicas, cristãs ou orientais, ele conclui que todas elas têm em comum a convicção de que certas atitudes são realmente verdadeiras, e outras são realmente falsas em relação ao que é o universo e ao que somos - são valores objetivos, ou respostas a uma ordem objetiva, que nos ajudam a reconhecer se nossos estados emocionais estão em harmonia com a razão (quando sentimos gosto por aquilo que merece aprovação) ou em desarmonia com ela (quando percebemos que deveríamos gostar de algo, mas não conseguimos fazê-lo).
Como contraponto, ele considera que as novas ideologias do nosso tempo representam uma ruptura com o Tao, mas que não passam de fragmentos dele próprio, arbitrariamente deslocadas do seu contexto mais amplo e depois levadas à loucura em seu isolamento. A rebelião de novas ideologias contra o Tao seria então a rebelião dos ramos contra a árvore; se os rebeldes tiverem sucesso, acabarão descobrindo que terão acarretado a destruição de si mesmos.
Para Lewis, a abolição do Homem seria a conquista final do Homem sobre outros Homens, uma consequência da prevalência dessas novas ideologias sobre os princípios gerais que constituem o Tao, tendo a Natureza como seu instrumento. A Natureza, não atrelada a valores morais, governaria os conquistadores e, por meio deles, toda a humanidade. Natureza, neste caso, seria tudo que passamos a entender analiticamente, para depois a dominarmos e a usarmos para a nossa própria conveniência, suspendendo nossos juízos de valor sobre ela, ignorando suas causas finais e passando a tratá-la apenas em termos de quantidade. Reduzimos as coisas à mera Natureza a fim de que possamos conquistá-las.
Ao final da obra, Lewis alerta para o perigo deste reducionismo a partir da nossa necessidade de querer enxergar o que está por trás de tudo para sempre. Reduzir o Tao a mero produto natural seria um passo desse tipo. O propósito de investigar minuciosamente (prescrutar) alguma coisa é ver a realidade através dela, mas não há serventia alguma em tentar enxergar o que está por trás dos primeiros princípios. Se você procurasse saber sobre tudo, então tudo seria transparente, mas um mundo totalmente transparente é um mundo invisível. Prescrutar todas as coisas é o mesmo que não enxergar nada.
Valores morais fundamentais não são princípios apenas da nossa cultura, mas de todas as culturas. Ao criar novas ideologias que procuram subverter ou negar esses valores, o homem está perdendo sua conexão com o Tao e destruindo a si mesmo. Ao reduzirmos tudo a um mero conhecimento do que é visível, perdemos a conexão da emoção com a razão, e, também, os valores objetivos que nos orientam no Caminho a ser seguido para nosso progresso como seres humanos.
Mesmo sendo um obra publicada há quase 80 anos, ela se mantém atual e assustadoramente profética. Somos testemunhas da substituição de valores considerados imutáveis, e que formam a argamassa da nossa base moral sobre o que consideramos certo ou errado, por valores artificiais (mas ditos como inovadores) criados e fomentados por indivíduos que buscam não a verdade, mas formas de controle e manipulação sobre outras pessoas. Uma batalha travada no seio de nossa cultura e no nosso sistema de ensino, mas que se espalha como um rastro de pólvora pela sociedade como um todo.
Edição especial em capa dura da Editora Thomas Nelson Brasil; 1ª edição (18 setembro 2017). Disponível na Amazon. Compre pelo nosso link.
Notas sobre o autor:
Clive Staples Lewis (1898-1963) foi um dos gigantes intelectuais do século XX e provavelmente o escritor mais influente de seu tempo. Era professor e tutor de Literatura Inglesa na Universidade de Oxford até 1954, quando foi unanimemente eleito para a cadeira de Inglês Medieval e Renascentista na Universidade Cambridge, posição que manteve até a aposentadoria. Lewis escreveu mais de 30 livros que lhe permitiram alcançar um vasto público, e suas obras continuam a atrair milhares de novos leitores a cada ano.
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