Chegamos a parte final da nossa série de artigos sobre Inovação. Se você ainda não leu os primeiros conceitos, pode começar por aqui.
Para fecharmos essa primeira sequencia (porque o assunto nunca se esgota e voltaremos a ele em breve), vamos falar um pouco sobre as formas que as empresas podem adotar a Inovação Aberta como estratégia de negócios.
Tipos de inovação aberta
Gassmann e Enkel (2004) e, mais tarde, (Conboy e Morgan, 2011), ampliaram e refinaram o conceito de inovação aberta em três grandes fluxos que podemos observar na figura abaixo:
O fluxo outside-in ou inbound acontece quando se traz para dentro do funil de inovação da empresa o conhecimento e expertise de fornecedores, clientes e de outros atores do ecossistema, como universidades, empresas e startups em variados modelos de interação, conforme veremos mais adiante, que permitem e/ou facilitam a resolução de desafios tecnológicos já existentes ou mesmo propiciam o desenvolvimento de novos produtos ou serviços.
O fluxo inside-out ou outbound ocorre na direção contrária quando o P&D da empresa desenvolve uma tecnologia ou solução que, devido a questões estratégicas ou de oportunidade, pode ser transferida para ser executada um parceiro externo. Normalmente, esse modelo de inovação aberta acontece quando a empresa percebe que não quer ou não tem capacidade de levar ao mercado todo o seu pipeline de projetos, mas o conhecimento gerado é percebido como valor para o setor, como uma patente, por exemplo e, então, é vendido ou licenciado.
O fluxo coupled é a evolução dos fluxos anteriores pois a dinâmica do compartilhamento de conhecimento e do desenvolvimento de tecnologias é bidirecional no qual, de fato, os parceiros trabalham em sinergia e em complementaridade. Nessa dinâmica, o aprendizado é mútuo e ambos os lados se beneficiam.
Certamente, é o modelo mais utilizado atualmente, principalmente, por empresas de alta tecnologia que vem sendo ameaçadas por soluções radicais e disruptivas propostas por novos entrantes em seus mercados. Em muitos desses casos, a melhor estratégia a ser adotada é a “se não pode com eles, junte-se a eles” e é a essência dos hubs de inovação e aceleradoras, que são duas formas de se fazer inovação aberta, como veremos agora.
Formas de se fazer inovação aberta
Joint ventures (JVs) e spin-offs: uma das primeiras formas de fazer inovação aberta. No caso das JVs, a empresa se alia a uma outra que detém uma tecnologia de interesse para juntas desenvolverem o produto ou serviço que chegará ao mercado. As spin-offs são originalmente unidades de negócios que em função da relevância da solução desenvolvida internamente derivam em novas empresas que podem ou não estar apartadas da “empresa-mãe”.
Prestação de serviços e consultoria: também uma das primeiras formas das empresas capturarem conhecimento externo de universidades e centros tecnológicos, aproveitando-se da elevada qualificação profissional e da infra-estrutura de laboratórios de excelência e especializados para pesquisa e desenvolvimento de etapas iniciais e intermediárias, necessárias à evolução do processo inovativo, mas que por questões que, normalmente, envolvem custos - financeiros e de oportunidade, não interessa que sejam desenvolvidas internamente.
Co-criação, crowdsourcing e programas de ideação: são mecanismos relativamente baratos de troca e geração de ideias com o objetivo de melhoramento ou desenvolvimento de novos produtos ou serviços com a participação de clientes, fornecedores e consumidores que fornecem insights e percepções valiosas que a empresa normalmente não tem condições de capturar dentro da sua própria estrutura e utilizando ferramentas mais tradicionais como pesquisas de marketing e de mercado.
Por exemplo, a Natura é uma das empresas pioneiras no Brasil em inovar aproveitando o compartilhamento das dores e percepções das necessidades dos clientes como ferramenta estratégica de competitividade mundial no mercado de cosméticos.
Hackathons: modelo nascido na indústria de software, é uma sofisticação dos formatos descritos no parágrafo anterior. Envolve a resolução de desafios propostos em um curto espaço de tempo - alguns dias, no máximo, em verdadeiras maratonas de desenvolvimento de soluções com a participação de equipes internas e externas, que fomentam a troca de experiências, a densidade de conhecimento compartilhado e o networking.
Atualmente, este formato de competição tecnológica é utilizado pelos mais variados tipos de empresas e também pelo setor governamental com muito sucesso, pois estimula a busca por respostas criativas e força os participantes a proporem rapidamente soluções que podem, inclusive, envolver a elaboração de MVPs (produtos mínimos viáveis) para solução dos desafios apresentados.
Incubadoras e programas de aceleração: duas formas de inovação aberta que são feitas através do acolhimento de empresas nascentes de base tecnológica, as famosas startups. Incubadoras propiciam suporte na forma de mentorias e infraestruturas para projetos nascidos nas bancadas de laboratório e que apresentam algum potencial de se tornarem produtos. Normalmente, ficam fisicamente instaladas em espaços dentro da própria universidade.
Já os programas de aceleração são normalmente patrocinados por empresas ou hubs de inovação para o desenvolvimento de produtos e serviços que se encontram em estágios mais avançados, e que já provaram ser modelos não somente viáveis como também repetíveis e escaláveis, que precisam agora ganhar tração para realmente chegarem ao mercado.
É uma das formas mais utilizadas pelas empresas para gerar conexões com startups inovadoras não só pela troca tecnológica proporcionada pela inovação aberta em si mas, também, como ferramenta de estratégia de negócios pois as mantêm bem próximas das empresas nascentes que um dia podem afetar - positiva ou negativamente - a proposta de valor dos produtos e serviços oferecidos.
Corporate Venture Capital (CVC): é o modelo de inovação aberta no qual as grandes corporações, além da opções demonstradas acima, também participam da scale-up (startup em rápido crescimento) efetivamente com investimento (equity), sem participação majoritária, que continua sendo dos fundadores. O aporte de recursos se dá normalmente através de fundos de investimentos, embora possa ser feito de forma direta, mas a lógica não é apenas de retorno financeiro.
A empresa ganha estrategicamente ao poder colaborar “por dentro” do modelo de negócio e disso extrair vantagem competitiva no mercado e para as scale-ups representa a oportunidade de alavancagem e tração que, provavelmente, demoraria muito mais para acontecer se continuassem a trilhar o caminho sozinhas. É também uma excelente forma de ganharem reputação no mercado e de terem a sua disposição uma base de clientes já mapeados para refinamento e ajustes necessários em seus produtos. Essa é a base do conceito de Smart Money, no qual o dinheiro vem atrelado ao expertise e, juntos, criam e exponenciam oportunidades.
Esse relacionamento mais visceral permite que empresas transformem muito mais rápido a cultura organizacional de inovação, tornando-se mais ágeis em responder às novas demandas do mercado e dos consumidores. Mas, por isso mesmo, precisa ser antes considerado que esta forma de se fazer inovação aberta pode desencadear uma enorme resistência funcional se não for feito um bom trabalho de base que prepare a organização para a grande mudança de mindset que virá na sequência da adoção deste modelo. Portanto, é preciso certa maturidade institucional para adotar CVC de forma construtiva.
Com esses conceitos finais, encerramos esse ciclo de oito artigos sobre Inovação.
Obrigada por ter me acompanhado nesta jornada até aqui e até breve!
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