Uma HQ sombria e mística
Eu preciso confessar, de forma um pouco acabrunhada, que é a primeira vez que eu leio Sandman, apesar de ser um dos maiores clássicos do universo das HQs e uma das séries mais premiadas de todos os tempos. Quando foi lançada, em novembro de 1988, eu já tinha 20 anos, e até sua última edição, em 1996, foram 75 números. Publicada pela Vertigo, um selo da DC Comics, foi escrita pelo brilhante e premiado Neil Gaiman, e suas ilustrações já passaram pelas mãos de grandes artistas como Sam Kieth, Mark Dringenberg e Dave McKean, só para citar alguns.
Sombria, mística e, porque não dizer, peculiar, Sandman foi a primeira HQ a entrar na lista dos best-sellers literários do New York Times. Suas histórias descrevem a trajetória de Morpheus (ou Sandman), o governante do Mundo dos Sonhos, pelos diversos planos de existência e suas interações com os seres que os habitam. Misturando mitologias modernas e ancestrais, a série costura ficção contemporânea, lendas e drama histórico.
Morpheus é um dos 7 Perpétuos (os outros são Destino, Morte, Destruição, Desejo, Desespero e Delírio), que são manifestações antropomórficas responsáveis pelo ordenamento da realidade conhecida e por manter coeso todo o universo físico. Seu reino, o Sonhar, é onde todas as mentes dos seres vivos estão ligadas. É para lá que vão as almas de todos os que dormem e onde são guardadas lembranças e pensamentos da hora do sono. O Sonhar guarda também o mundo imaginário de cada sonhador, que é constituído por várias realidades alternativas e seres imaginários que se escondem por lá. Toda a sanidade mental dos seres depende da boa administração desse reino (já que a realidade física do universo e mental dos seres também depende de nada "vazar" de lá para cá) e Morpheus precisa executar suas funções de forma impecável.
Neste primeiro volume da edição especial de 30 anos, chamada de Prelúdios e Noturnos, temos as primeiras 8 histórias do personagem. Tirado do seu plano de existência pela magia de um bruxo, Lorde Magus, e sua Ordem dos Antigos Mistérios, Sandman fica preso durante 70 anos numa espécie de cela mística. Quando consegue finalmente se libertar, sai a procura dos 3 objetos (que ele chama de ferramentas) que lhe foram tirados durante sua prisão e que, sem eles, o impedem de reestabelecer por completo seu poder.
Indo, literalmente, até o Inferno para buscar uma de suas ferramentas, Morpheus enfrenta demônios, psicopatas assassinos e entidades do seu próprio mundo para recuperar não apenas seu poder, mas também para fazer com que o mundo dos sonhos, já combalido por sua ausência de décadas, também reestabeleça sua ordem. Encontros com personagens icônicos da Vertigo, como John Constantine, que o ajuda a encontrar a primeira ferramenta, e outros heróis e vilões da DC, como o Caçador de Marte e o Dr. Destino, que o enfrenta para manter a posse da pedra dos sonhos, último dos objetos a ser recuperado, reafirmam a interconexão com todo o universo da DC Comics.
Ao final, temos uma espécie de prelúdio para novas histórias do Rei dos Sonhos. No encontro com sua irmã, a Morte, Morpheus encontra um novo propósito para sua existência, uma nova motivação para exercer suas responsabilidades com o Senhor dos sonhos e dos devaneios de todos os seres vivos. Afinal, o que seria da realidade sem não sonhássemos?
A edição em capa comum da Panini tem 240 páginas e contém, como já dito anteriormente, as edições de 1 a 8 de Sandman:
Notas sobre o autor:
Neil Gaiman é considerado um dos maiores escritores vivos. Com mais de vinte livros publicados, ele já foi agraciado com diversos prêmios, incluindo o Hugo, o Bram Stoker e a Newberry Medal. Começou a carreira como jornalista, mas logo ingressou no mundo dos quadrinhos com a aclamada série Sandman, e, depois, conquistou a ficção adulta e a literatura infanto-juvenil, publicando obras como Deuses Americanos e Coraline. Alguns de seus livros foram adaptados para o cinema e para a TV, e a série da Netflix inspirada em Sandman tem estreia prevista para esse ano.